Brincar de guerra, mais do que entretenimento para crianças ucranianas
Mais de 500 crianças morreram desde o início da invasão, segundo dados da ONU
- Categoria: Notícias Gerais
- Publicação: 18/05/2023 14:11
- Autor: Por Joshua Melvin e Elizabeth Striy, da AFP
Eles usam capacetes de segunda mão e suas armas não matam. Brincar "de guerra" virou uma realidade para as crianças ucranianas.
Com seu rastro de destruição e sofrimento, a invasão russa impactou as brincadeiras infantis e a forma como as crianças interagem.
"Gosto muito de brincar de guerra. Quero crescer e ser um verdadeiro herói de guerra", diz Maksim Mudrak, um menino de 10 anos com um uniforme de tamanho infantil, um capacete grande demais para sua cabeça e uma arma de plástico.
O pai de Maksim, Oleksii Mudrak, que não era militar, foi morto perto de Kiev no início da invasão russa, no dia que saiu para entregar suprimentos aos voluntários, conta a família.
A avó do menino conta que Maksim passou a se interessar cada vez mais pela guerra desde o início da invasão e desde a morte de seu pai, em 4 de março de 2022, aos 40 anos.
"Ele ficou muito abalado com a morte do pai. Maksim pensa nele o tempo todo. Ele vai ao cemitério e começa a chorar", conta sua avó, Valentina, de 72 anos.
Para Maksim, tornar-se soldado é uma forma de preservar a memória do pai, e ele tem uma ideia muito clara de quem foram os culpados.
"Vejo os russos como meus piores inimigos", diz Maksim, que mora com a avó perto de Kiev, em Stoyanka, e mantém contato com a mãe. Os russos "são ruins"
A guerra significou para muitas crianças ucranianas a perda de entes queridos, o afastamento de suas escolas ou de suas casas e ficar expostas a todos os tipos de horrores.
Mais de 500 crianças morreram desde o início da invasão, segundo dados da ONU.
A psicóloga Katerina Goltsberg explica que as crianças sempre brincaram de guerra em situações de conflito, e que esse recurso é uma forma de processar suas vivências.
Embora todas as crianças ucranianas tenham sido afetadas pela guerra em maior ou menor grau, resta saber até que ponto essas experiências levarão a traumas ao longo da vida.
Lesia Shevchenko conta que sua filha Dana, de 8 anos, costumava perguntar apenas uma coisa quando conhecia outras crianças: "Qual é o seu nome? Vamos brincar!"
Mas em uma viagem em família à Bulgária, após o início da invasão da Ucrânia, Shevchenko percebeu que a filha começava com outra pergunta: o país de origem.
No caso das crianças russas, Dana virava e se afastava em silêncio.
"Não tenho vontade de falar com eles, só isso. Provavelmente porque acho que todos os russos são de uma certa maneira e porque para mim eles são ruins", explica Dana.
Sua mãe, uma dentista de 49 anos, diz que não foi ela que ensinou o comportamento e que, ao contrário, a fez ver que não é possível odiar de maneira indiscriminada.
Mas Dana ficou traumatizada com a guerra e os bombardeios a deixaram com muito medo de barulho.